Amor que já se apagou.

D06

Sempre me comovem declarações de um amor que já se apagou.
Declarar um amor que não mais existe é deixar aparecer no fino tecido do que há um fio com a textura do que não há e as cores do mais belo entre os paraísos perdidos.

É a concreta existência da ausência, ainda (e porque) ausente qualquer existência.
É trançar os fios do manto da realidade com o pós-ser e com o pré-não-ser, sendo e não sendo, assim, ao mesmo tempo. E também antes. E também depois.

É a existência e o tempo em quartos diversos e separados, ainda que, em algum ponto, venham a se tocar, abraçar, beijar, amar – querendo-se de mãos dadas pelas ruas, sem se importar com os outros, enquanto influenciam, porém, todas as ações ao seu redor.

Quanto tempo dura essa existência? E onde é que existe esse tempo?
E o instante, quando é?
E onde? E como?

Quando que eu aperto o disparador para que exista aquela fotografia polaroide inesquecível?

As polaroides se apagam, enfim, no fim.
Mas não deixam de existir.
Como o amor.

2 comentários:

  1. Curioso. Mais cedo, li sobre casos mal resolvidos - esses não-relacionamentos que se prolongam no espaço-tempo emocional e nos mantém presos num limbo onde não se está nem junto nem sozinho.
    De certo modo, a idéia se comunica com isso.
    Outra associação inevitável (E bastante brega, eu sei) é com a canção que diz "em algum lugar do tempo nós ainda estamos juntos".
    No final, é tudo interligado.
    Experimentamos um sentimento e mesmo quando as memórias começam a desvanecer, algo dele permanece. Não ele em si, mas um fragmento qualquer, uma lasca que se torna nossa relíquia. Guardamos com cuidado, e, de tempos em tempos, como uma polaroide apagada, pegamos pra relembrar.
    É que o que realmente nos toca, nunca deixa realmente de existir.

    Ps. a coluna é bacana, vale você dar uma olhada
    http://revistaepoca.globo.com/Sociedade/ivan-martins/noticia/2012/05/casos-inacabados.html

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    1. É, a ideia é essa, pegar a polaroide apagada, lembrar e ter certeza que tocamos pra frente. :)
      Eu li aqui a coluna e acho que tem algumas coisas ali bem verdadeiras. Mas aqui eu não estava falando de um amor mal resolvido daquele jeito.
      Aqui é mais quando a gente termina, continua gostando e segue. Sem flashback. E o amor desbota com o tempo. Continua lá, mas as cores agora são outras. É um amor diferente, um querer bem que quer um abraço, não mãos dadas. Desses amores, desses sim, tenho uma pequena coleção particular. Não os tenho como mal resolvidos: resolvemos por manter amizade, não pelo distanciamento (que costuma ser comum). Hoje, mesmo nos momentos de carência, como ele fala no texto, eu busco sim os braços dessas pessoas, mas não para nada mais que um abraço. Um abraço e um sorriso já me trazem de volta as cores.
      E então eu declaro um amor que já se apagou(eu amei) e um que ainda está sendo escrito (estou amando).

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